E você, quantos erros já cometeu hoje?

4 de abril de 2023
Por Jayme Kopke

No seu marketing, nas ações do dia-a-dia, na educação dos seus filhos, os erros são inevitáveis. Sabendo disso, qual é a melhor maneira de lidar com eles?

Como ia viajar por alguns dias, a procura do sítio onde estacionar foi feita com cuidado: antes de me afastar do carro, até verifiquei se a vaga estava mesmo ok. Claro que estava: tinha por cima aquela placa com um grande P. Parti tranquilo.

Só que, quando voltei, o carro tinha sido rebocado. Como era possível? Fui ver de novo a placa. Tinha, sim, aquele grande P, mas logo abaixo o ícone da cadeirinha de rodas – que eu simplesmente não tinha visto. Tinha ficado tão contente com o P que o meu cérebro ignorou o resto. O resultado era uma dolorosa multa para pagar.

Face a um erro tão estúpido, adoraria encontrar uma explicação que me deixasse menos irado comigo próprio, mas neste caso não havia. Não estava cansado nem a pensar noutros assuntos. Tinha verificado com atenção, voltado a verificar. Mas, mesmo com todos os cuidados, errei.

Na mesma semana, tive que ouvir – merecidamente – a descompostura de um cliente por um trabalho entregue com erros. Antes já houvera um engano parecido, que tínhamos prometido corrigir. Redobramos os controlos – e voltamos a errar. Como no caso do carro, gostaria muito de achar um culpado claro: alguém que falhou, processos desrespeitados. Mas, mais uma vez, não havia. Os processos foram seguidos mas, sabe-se lá porquê, o erro voltou a escapar a toda a gente.

Para erros assim, o único consolo vem de algumas leituras que tenho feito. Em Thinking, Fast and Slow, Daniel Kahnemann mostra como o cérebro humano é propenso a cometê-los.

Já em The Case Against Reality, Donald D. Hoffman dedica vários capítulos ao mesmo ponto. Segundo o livro, a evolução não otimizou o nosso cérebro para a objetividade ou para a exatidão. Para sermos eficientes, em cada contacto com o mundo apreendemos sempre uma fração ínfima da realidade. A vantagem é conseguirmos focar no que é importante para a ação. A desvantagem é passarmos vida a incorrer em vieses, ilusões sensoriais, erros. Como o da história de há pouco – em que foquei no P (a informação que procurava), excluindo o resto.

Errar, definitivamente, é humano – e pelo menos nisto estamos todos de acordo. Embora, naturalmente, achemos sempre que os outros erram bem mais do que nós. Políticos, por exemplo, erram o tempo todo – na opinião de adversários, comentadores e da população em geral. Futebolistas também – na opinião, quase sempre exaltada, até dos seus próprios fãs.

Mas não são só eles: você, eu, toda a gente está sempre a cometer erros. A questão inevitável, então, é: como lidar com eles?

É claro que nem todos os erros são iguais. Há os erros não programados – sejam ou não tão estúpidos como o que contei lá no início. Mas há também os programados: os que sabemos que vamos cometer, quando não temos informação suficiente e é preciso avançar no escuro. Nessas situações, já sabemos que a saída é tentar, errar, aprender, tentar outra coisa. Repetir as vezes que forem necessárias. É o que fazem os cientistas, as equipas de inovação e também, tantas vezes, as de marketing.

A diferença é importante, porque leva a maneiras distintas de reagir ao erro. No caso dos erros programados, já sabemos à partida para que servem: para identificar as hipóteses a excluir, criar um repertório de caminhos que não valem a pena. O erro, então, é bem-vindo. Passa a ser parte do processo.

Os erros inesperados também servem para aprendermos com eles – embora, numa primeira reação, raramente nos lembremos disso. Preferimos espernear e encontrar alguém para punir – mesmo que sejamos nós próprios. Erros destes não exigem apenas um maior esforço de análise para saber o que falhou. Exigem também um esforço emocional muito maior para aceitar o erro e seguir em frente.

O esforço emocional é ainda maior é no caso dos tais erros estúpidos de que comecei por falar. Nesses, em que é difícil encontrar alguma lição útil, tudo o que apetece é levar as mãos à cabeça, mandar para o alto dois ou três palavrões e, se for possível, esquecer.

Mas é claro que há outras alternativas. Quando eu era criança, na casa dos meus pais servia-se de vez em quando um “bolo errado”. Era um bolo que havia saído mal – segundo a receita – e que, por isso, ficara muito mais delicioso. Erros inesperados podem ser fontes de inovação – assim estejamos preparados para os acolher.

E, em qualquer caso, lições a tirar do erro sempre há, nem que seja uma lição de humildade. Programados ou não, estúpidos ou nem por isso, os erros vão estar sempre no seu caminho. Mais vale aprender a aceitá-los, seja em nós próprios ou nos outros. Ou mesmo a encorajá-los – se acreditarmos na máxima de que só não erra quem não faz.

Seja no seu marketing, na educação dos seus filhos, na relação com o cônjuge, com a sociedade ou até consigo mesmo, a pretensão de que “não vamos admitir erros” é apenas isso mesmo. Uma pretensão. E um erro.

Fonte: Dinheiro Vivo

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