“Se é tão óbvio, por que não compreendem?”
Se já teve que vender algo, especialmente num contexto B2B, provavelmente já se defrontou com esta situação. Os argumentos com que defende a sua proposta são “óbvios” – mas, mesmo assim, quem está do outro lado teima em não os entender. A reação imediata, nesses casos, é espernear: chamar (para os seus botões) o interlocutor de estúpido, declarar que “só neste país”, queixar-se da vida. Mas, passado esse momento de pura humanidade, o que é possível fazer para resolver a situação?
Na verdade, não é algo que se restrinja às situações de venda – longe disso. Aposto que também já lhe aconteceu com um cônjuge, um colega de trabalho ou com alguém que tem opiniões políticas ou futebolísticas diferentes das suas. Por mais que explique algo que para si é evidente, a outra pessoa não se convence.
A diferença, numa venda, é que pode doer mais – porque dói no bolso. A sua proposta é obviamente melhor do que a do concorrente. Custa um pouco mais, é verdade – mas não é óbvio que o barato sai caro? Toda a gente sabe. Como é que o cliente não vê?
A primeira razão que ocorre também é óbvia: o cliente é estúpido, ou então não está de boa fé. Mas não é uma explicação muito útil: desqualificar o interlocutor raramente ajuda a persuadi-lo. Mais vale perguntar-se: o problema, na verdade, não estará em mim? Na minha maneira de comunicar o que para mim é evidente mas, para a outra pessoa, nem por isso?
Não, o outro não é estúpido. Onde está o problema, então?
Se o problema é de comunicação, um bom começo é tentar identificar a sua origem. A mim ocorrem três possibilidades:
1) As perspectivas são diferentes. Normal, não?
A realidade nunca é igual para todos: cada um a vê de um ângulo diferente, e um ângulo é necessariamente melhor do que o outro. Para o seu cliente, pode não estar em dúvida a qualidade superior da sua proposta, só que neste momento a poupança imediata lhe dá mais jeito do que os ganhos a prazo. O barato pode sair caro a longo prazo, mas neste momento sai barato, e para já é o que importa.
Em situações de venda B2B a coisa ainda é mais complicada, uma vez que as decisões importantes implicam quase sempre várias pessoas, cada uma com a sua perspectiva. Para a diretora técnica, por exemplo, a qualidade é inegociável, mas na sala ao lado só querem saber do preço.
É importante observar que que estas visões diferentes nem sempre serão comunicadas com clareza. Isto pode ser intencional e, sim, incluir alguma má fé. Ao cliente pode não dar jeito admitir os verdadeiros motivos para não preferir a sua proposta – motivos políticos, por exemplo, numa empresa em que haja guerras de egos ou de poder.
Mas também pode ser inconsciente – como no caso de um cliente que adoraria acreditar que privilegia sempre a qualidade, mesmo quando, na prática, decide pelo preço. A maneira de se reconciliar com essa autoimagem enganosa é encontrar razões, mesmo que ofendam um bocadinho a lógica, para desqualificar a melhor proposta e exaltar a mais barata. Chama-se a isso racionalizar – uma capacidade em que nós, humanos, somos imbatíveis.
Ponha-se no lugar deles
Pensar que os outros são estúpidos é arrogante, mas abandonar a arrogância não implica abandonar as minhas convicções. Implica melhorar a minha capacidade de persuasão, encontrando a razão por trás das razões do outro e, quando possível, a forma de lhes dar conforto.
O primeiro passo é pôr-se na pele do interlocutor – identificando-se, pelo menos temporariamente, com o seu ponto de vista, os seus receios, até com os seus preconceitos. Se esse “outro” for no plural – o caso mais frequente no B2B – é claro que isto vai dar mais trabalho. Mas é um trabalho indispensável para que, a seguir, possa repensar cada um dos seus argumentos em função das resistências que encontra.
O resultado, normalmente, é que os seus argumentos saem fortalecidos. Mas pode também acontecer que o que lhe parecia óbvio num primeiro momento de repente já não o seja tanto: as objeções de um comprador, quando ouvidas com cuidado, podem revelar fraquezas reais da sua oferta. Vai doer um pouco, mas encarar a realidade é sempre o pré-requisito para mudá-la a seu favor.
2) Os pressupostos não são partilhados
Tudo o que é “óbvio” só o é em função de pressupostos que muitas vezes assumimos como partilhados, quando não são. Se o seu cliente está convencido que um bom packaging ajuda a vender o seu produto, facilmente aceitará o investimento que isso implica. Mas, se nunca sequer pensou no packaging como um fator de sucesso, vai achar esse custo absurdo.
Se ao apresentar uma proposta de packaging não me certificar, antes, de que o pressuposto é consensual, corro o risco de uma surpresa desagradável.
Mais uma vez, esse risco aumenta ao lidar com uma empresa. Diferentes decisores estudaram em diferentes escolas, leram diferentes livros, têm ideias diferentes sobre como conduzir um negócio. O que é investimento para um é apenas custo para outro. O que é essencial para a Diretora A nem passa pela cabeça do Diretor B. Quando apresento a minha proposta, tenho a certeza de que os meus pressupostos são os mesmos para todos os que têm voz na matéria?
Defina as regras antes do jogo
Alinhar pressupostos com os seus clientes é um trabalho que começa bem antes da venda. Quando alguém escolhe a sua empresa, por exemplo, convém que seja porque já se identifica com a sua forma de trabalhar, as suas ideias, valores, convicções.
Normalmente isto acontece porque houve antes todo um trabalho de educação, em que a sua filosofia de trabalho foi exposta de forma continuada – e persistente.
A paciência aqui é chave porque educar supõe repetir e repetir as mesmas ideias – mas não é uma virtude fácil. Ao contrário dos seus potenciais clientes, que só vão ver a sua comunicação de vez em quando, você, que está sempre exposto a ela, rapidamente vai achá-la repetitiva e monótona. E vai querer parar antes do tempo.
Na Hamlet, por exemplo, houve uma altura em que publicamos com frequência sobre as vantagens do email marketing. Um dia, cansamo-nos: parecia ser algo que já “toda a gente já sabe”. Mas não é assim: hoje, ao apresentar propostas que incluem o email, surpreende-me que tanta gente ainda o considere um canal morto ou inútil.
Não deveria ser uma surpresa. Por maior que seja a sua audiência, é sempre pequena face ao mercado. E, mesmo entre os clientes que já viram os seus conteúdos, o mais provável é que não passem os dias a rememorá-los. Por isso têm de ser constantemente lembrados das ideias que a sua empresa defende – na verdade, os pressupostos para que um dia venham a comprar os seus produtos. É claro que isto coloca um outro desafio: como repetir as mesmas mensagens sem ser repetitivo? Mas esse é um tema para outra conversa.
3) Ruído
Muitas vezes a razão para que um argumento, mesmo sendo óbvio, não convença, é que quem está do outro lado simplesmente não o está a ouvir. Também aqui, podemos espernear, recriminar o nosso interlocutor, mas não adianta muito: não nos ouvirmos uns aos outros, na nossa ruidosa sociedade, é um facto da vida. Mais vale encarar o assunto como mais um problema de comunicação: como conseguir que quem está do outro lado preste atenção ao que estou a dizer?
Mais uma vez, no B2B isto se complica por causa das cadeias de decisão. Eu posso ter apresentado a minha proposta a um interlocutor que a ouviu com carinho e até comprou os meus argumentos. Só que esse interlocutor não decide sozinho. E, a jusante, quem também tem voz na matéria pode ter muitas desculpas para não dar à proposta a devida atenção. Porque não tem tempo, não está para isso ou então porque a relevância da proposta, apresentada em segunda mão, não pareceu convincente.
Como, então, conseguir que a sua proposta “viaje bem” dentro da organização, cativando e convencendo mesmo quem não é o seu interlocutor direto?
Não tenha medo de explicar o óbvio
Na Hamlet tivemos este problema recentemente – na verdade, pela enésima vez. A nossa proposta tinha entusiasmado o nosso interlocutor direto. Mas, quando chegou aos decisores finais, o entusiasmo foi nenhum.
Fomos rever a apresentação e o motivo ficou claro: fora preparada para a pessoa que já nos conhecia e com quem já tínhamos falado muito sobre o projeto. Para os seus chefes, ao contrário, éramos uns perfeitos desconhecidos, e a proposta, que viam pela primeira vez, não parecia suficientemente fundamentada.
Felizmente pudemos reformular. Reforçamos as nossas credenciais e explicitamos todos os argumentos que estavam implícitos, por já terem sido tão falados com o nosso primeiro interlocutor. E prometemo-nos que não voltaríamos ao mesmo erro: para a próxima, a proposta tem que ir com tudo, mesmo que pareça evidente – porque não sabemos que olhos a vão escrutinar.
É claro que, também aqui, o trabalho feito antes da venda também ajuda. Para um CEO com mil coisas na cabeça, os minutos que tem para a sua proposta, mesmo quando bem apresentada, podem não bastar para uma análise cuidadosa.
O risco é que então decida de forma apressada, levando mais em conta as suas ideias pré-concebidas do que os argumentos que você elaborou com tanto esforço. Mas isso pode mudar se, ao abrir a sua proposta, ele encontrar um nome conhecido, sobre o qual já tem uma opinião favorável. Nesse caso, a ideia preconcebida joga a seu favor. Daí a importância de comunicar a sua marca com frequência. Lembre-se disso.
Como tornar o óbvio evidente. E vice-versa
Resumindo: o que é óbvio para mim não o é para toda a gente, e por diferentes razões. Mas se para atingir o meu objetivo é preciso o acordo de quem está do outro lado, mais vale não esperar que cheguem lá sozinhos. Quando o seu óbvio não é óbvio para o outro, a sua comunicação tem de ser duplamente eficaz.
Comunicação eficaz, by the way, especialmente em contexto business-to-business, é mesmo a praia da Hamlet. Por isso, se precisar de ajuda para que vantagens da sua marca se tornem óbvias mesmo para os clientes mais cabeçudos, entre em contacto connosco.