Os decisores empresariais são seres humanos como os outros?
Muitas empresas B2B parecem acreditar que a humanidade é composta não por uma, mas por duas espécies. Uma são os Humanos. A outra, que eu pensava que não existia, afinal é descrita pela ciência, incluindo um ou dois prémios Nobel. É composta de seres 100% lógicos, o que engloba aparentemente todos os decisores empresariais. Mas será mesmo que eles andam aí?
Os decisores empresariais são humanos como os outros? Aparentemente, há quem pense que não.
Quem fez este anúncio, por exemplo (que tirei de um número da Harvard Business Review lançado já algum tempo), não deve acreditar que está a falar com pessoas como as outras.
Senão, como é que se lembraria de comunicar de forma tão fria, tão chata, tão despida de emoção?
E o preocupante é que boa parte da comunicação dirigida a decisores empresariais é assim. Feita, ao que parece, não para humanos, mas para outra espécie qualquer.
Há algum tempo escrevi que esta espécie devia ser parecida com a dos habitantes de Vulcano – o planeta do Mr. Spock.
Mas depois – ao ler o fabuloso Thinking, Fast and Slow, do Nobel de Economia Daniel Kahneman (em português, “Pensar, Depressa e Devagar”) – descobri que não era preciso ir tão longe. A tal espécie é mesmo cá da Terra. E a ciência – mais precisamente, a Economia Comportamental – até tem um nome para ela.
São os Econs.
Econs e Humanos. Descubra as diferenças.
Um Econ, ou Homo Economicus, chama-se assim porque corresponde a um pressuposto da economia clássica: o de que os agentes económicos (ou seja: todos nós) decidem sempre de forma absolutamente lógica, a ponderar ganhos e perdas e a escolher as opções que defendem os seus próprios interesses.
Exatamente como o Mr. Spock, o Econ é sempre racional. Não influenciável, portanto, a não ser por argumentos lógicos. A forma como esses argumentos são apresentados é irrelevante. Venham em letra grande ou pequena, acompanhados ou não de imagens, ilustrados ou não por uma boa história, o Econ analisará tudo e tirará as conclusões que a lógica lhe ditar.
Ao contrário dos Econs, o que economistas e psicólogos como Kahneman têm demonstrado é que há uma outra espécie – os Humanos – que decide de forma totalmente diferente.
Os Humanos, por muito que tentem, não são especialmente racionais. A sua decisão é frequentemente “enviesada” por mecanismos mentais que não controlam – e de que nem sequer têm consciência. Diante dos mesmos factos e argumentos, os Humanos decidem ora de um modo, ora de outro. Sem qualquer coerência, e muitas vezes contrariando os seus próprios interesses “racionais”.
Ao contrário dos Econs, para os Humanos argumentos idênticos podem levar a conclusões muito diferentes se forem apresentados em letra grande ou letra pequena. Se forem acompanhados da fotografia A ou da fotografia B. Se nesse dia estiver a fazer sol ou a chover.
E os seus clientes, são Humanos ou Econs?
Para a comunicação de marketing, saber que os Humanos são tão diferentes dos tais Econs não é propriamente uma surpresa. Embora os mecanismos precisos da nossa falta de lógica não tivessem sido tão esmiuçados antes dos trabalhos de Kahneman, Thaler e outros, sempre soubemos que ela comandava os comportamentos dos consumidores.
Fossem os Humanos mais lógicos e a criatividade publicitária não faria qualquer diferença. Argumentos racionais (preço, atributos, qualidade, conveniência) bastariam para decidirmos pela marca A ou pela marca B.
Aliás, nem faria sentido haver marcas: decidiríamos produto a produto, atributo a atributo (e passaríamos a vida, e talvez mais, nessa tarefa). Não seríamos influenciáveis – como somos – pelas cores de uma loja ou pela forma de uma embalagem. Trocar minúsculas por maiúsculas, ou uma palavra pelo seu sinónimo, num anúncio no Google, não levaria a taxas de cliques totalmente diferentes. E ninguém pagaria várias vezes mais por um pedaço de tecido, só pelo facto de trazer escrito PRADA em vez de ZARA.
Na comunicação de marketing, embora não os conhecêssemos por esse nome, desde sempre soubemos que os Econs são como o Mr. Spock: não existem.
Ou, pelo menos, uma parte da comunicação de marketing sabia disso: aquela dirigida ao consumidor. Por alguma razão, quando falam com decisores empresariais, muitas empresas continuam a falar para os Econs.
E isto apesar de “consumidores” e “decisores empresariais” serem simplesmente papéis assumidos pelas mesmas pessoas. É como se, por vestir uma gravata, o sujeito que era Humano no fim-de-semana mudasse de espécie mal põe os pés no escritório.
Se o seu público são decisores empresariais e quer que a sua comunicação funcione, não os trate como Econs.
Apele às suas emoções. Explore os seus medos. Acenda os seus desejos. Conte boas histórias, que lhes enviesem o raciocínio a favor do seu produto. Escolha a foto e o tamanho de letra certos. Teste todos os sinónimos do dicionário até achar aquele que – sabe-se lá porquê – faz o gestor clicar no seu anúncio.
Resumindo: não trate os seus potenciais clientes como seres racionais. Trate-os como seres humanos.
E, se precisar de ajuda para que a sua comunicação Business-to-Business seja também Human-to Human, é só dar um toque à Hamlet.