O que faz com que o digital ainda intimide tantas empresas?
No final de 2014 participei numa conferência da Associação Industrial do Minho sobre as oportunidades abertas pelo digital para as empresas. Olhando para a forma como a maior parte delas ainda tira tão pouco partido destas oportunidades, o título da minha intervenção foi uma pergunta: “Quem Tem Medo do Marketing Digital?” Mas mais importante do que saber quem é entender porquê: o que faz com que o digital ainda intimide tantas empresas, principalmente entre aquelas que mais poderia ajudar?
O meu primeiro pensamento, ao receber o convite da AIMinho, foi como era estranho ser convidado a falar do marketing digital como uma nova oportunidade, quando é algo que já está em tudo o que fazemos. Hoje comunicamos, fazemos compras, vamos ao banco, lemos, ouvimos música, até amigos fazemos digitalmente.
É verdade que tudo isto não tem muitos anos. Mas as mudanças nesta área têm sido tão rápidas que inovações relativamente recentes – como a nossa dependência dos motores de busca – parecem ter décadas. Uma das consequências é que nem todos tivemos tempo de nos adaptar e de tirar proveito destas mudanças.
Enquanto publicitário contacto com a realidade de muitas empresas. A timidez face ao digital é visível nas PME, justamente aquelas que estas “novas” tecnologias mais poderiam ajudar. Mas também acontece em empresas maiores, com menos desculpas para andarem desatentas.
É certo que hoje qualquer empresa tem um site ou, pelo menos, uma página no Facebook. Mas a maioria fica-se por aí: criam um site estático e pouco interessante. Depois deixam-no ali a ganhar pó, gerando poucas visitas, zero vendas, nenhum benefício para a marca. E já está: este é o partido que inúmeras empresas tiram do digital.
A segunda estranheza que me ocorreu ao ser convidado para o seminário teve a ver com o próprio convite. Eu, confesso, nunca ouvira falar da AIMinho. Como é que a AIMinho ouviu falar de mim?
A surpresa não traduz modéstia, só uma constatação objetiva. A Hamlet é uma empresa pequena. Mesmo com bons clientes como a Leaseplan, a Novabase, a ANA, a EDP, a Prio e outros, não somos exatamente famosos. O facto de não trabalharmos tanto o consumidor final mas nichos mais restritos do B2B diminui a nossa exposição. E a minha notoriedade pessoal não é maior.
Apesar disso, quando a AIMinho procurou alguém com algo a dizer sobre o marketing digital, o nome da Hamlet, e o meu próprio, apareceram. E apareceram associado a alguma autoridade na matéria, o que deu à AIMinho segurança para me chamar ao palco. Ao lado, para mais, de organizações como a ACEPI, o Paypal ou o Google, com uma uma visibilidade sem qualquer comparação com a nossa.
Como isto aconteceu? Graças à internet. Com recursos contados para o nosso próprio marketing, é aí que a Hamlet tem apostado. Não só para nos tornarmos “encontráveis”, mas até para exercitar o know-how com que depois ajudamos os clientes a fazer o mesmo: ganhar notoriedade e vendas através de meios digitais, começando pelos gratuitos ou de baixo custo. E evoluindo para os que exigem mais investimento, mas com a segurança de poder medir o retorno de cada cêntimo investido.
Ou seja: praticamos o que pregamos, e um convite como o da AIMinho é mais uma evidência de que resulta. É o tipo de “milagre” que o digital pode fazer: pôr ao alcance de qualquer empresa instrumentos de comunicação antes inacessíveis – a não ser a um custo só comportável para as grandes organizações.
A Hamlet é só mais uma empresa desconhecida que, graças ao digital, ganha uma “fama” localizada. Não aparece na Caras ou nas primeiras páginas dos jornais. Mas consegue ser vista e reconhecida no seu nicho – ali onde o que tem a dizer é relevante e útil.
Para a maioria das empresas esta é a única fama que interessa. Se a sua marca é consumida por toda a gente e tem de se vender aos milhões – uma Coca-Cola, uma Nike, uma Peugeot – é essencial ter fama a sério. E precisa investir milhões para manter essa fama.
Mas a maioria não tem esses milhões nem precisa dessa visibilidade. Para elas, a revolução digital é uma bênção. Hoje qualquer marca pode ser célebre no seu nicho. Pode, não: tem de o ser, já que os mesmos recursos estão disponíveis à concorrência.
Sendo que “nicho” não significa necessariamente pequeno ou limitado no espaço: você pode ser um desconhecido internacionalmente conhecido. Aliás, se a sua marca tem ambições ao mercado global (e convém que tenha), é precisamente o que deve procurar.
E a visibilidade é só o primeiro degrau. O seguinte – e ainda mais valioso – é transformá-la num diálogo com a sua audiência e, em última análise, em vendas.
Também aqui a oportunidade é também necessidade, já que, cada vez mais (e especialmente no business-to-business), a escolha de um fornecedor é feita online. Estudos mostram que 94% dos compradores empresariais primeiro pesquisam online, e que 57% da decisão de compra é formada antes de contactar qualquer fornecedor.
Ou seja: se os seus concorrentes tiverem presença online e a sua empresa não, boa sorte. E aí mora o enigma que dá título a este artigo. Se hoje tudo isto já é tão conhecido, porque é que tantas empresas escolhem ficam de fora de onde tudo acontece?
Ocorrem-me 3 explicações:
- Muitas empresas, apesar de tudo, ainda não perceberam a oportunidade;
- Algumas ficam intimidadas pela tecnologia;
- Para a maioria o problema não é o digital: é o marketing.
Em relação ao primeiro ponto, acredito que muitas empresas vivem tão concentradas em sobreviver que nem reparam na possibilidade de sobreviver muito melhor. A esperança é que artigos como este ou eventos como o da AIMinho vão abrindo os olhos a mais gente para o tema.
O segundo ponto tem a ver com a percepção de que o mais complicado no digital é dominar a tecnologia. Tecnologia que, aliás, não pára de mudar. Cada especialista aponta um caminho diferente, e mal você se dispõe a seguir o conselho já há N novas ferramentas que deveria dominar. Quem consegue acompanhar este ritmo?
Eu, seguramente, não consigo. Mas também não me faz falta. “Estar em dia” com cada novidade é não só impossível como inútil. Tecnologia compra-se no mercado, e não faltam pessoas qualificadas para implementar o que quisermos. O ponto crítico não é dominar a tecnologia, mas saber o que queremos fazer com ela.
E, neste ponto, boas notícias: enquanto a tecnologia muda muito depressa, o tal marketing digital não muda assim tanto. Até porque o marketing digital não existe: o que existe é marketing. E, em particular, marketing direto, a modalidade do marketing voltada para interações personalizadas e com respostas mensuráveis de que o digital não é mais do que uma variante.
O marketing direto existe e vem sendo aperfeiçoado há 150 anos. Com o digital tornou-se mais mais poderoso e, principalmente, acessível a qualquer empresa com ligação à internet.
O que nos leva ao terceiro ponto. Muitas empresas ainda não descobriram o marketing digital porque não descobriram o próprio marketing. Ainda não sabem como é vital para a sua sobrevivência e crescimento. Talvez por não terem precisado: tinham, por exemplo, um modelo baseado nas vendas, em bater a todas as portas, que ainda vai funcionando nalguns casos – só que cada vez menos.
Num mundo em que tudo acontece online, descobrir o marketing é inevitavelmente descobrir o marketing digital. Até porque, se uma das razões para não fazer marketing os custos envolvidos, com o digital tudo fica mais fácil. O que era só para grandes “anunciantes” está ao alcance de qualquer empresa. E a sua, já deu o salto?
Jayme Kopke
da Hamlet