Das brigas de casal para o marketing: já ouviu falar em “reactance”?

Eu também nunca tinha ouvido falar. Mas o conceito de “reactance” – “reatância” – é útil não só para entender e evitar algumas discussões lá em casa, mas também para produzir mensagens de marketing que não geram resistências, mas resultados.

 

Foi no Hidden Brain – um podcast sobre comportamento humano altamente recomendável para quem está no marketing – que ouvi pela primeira vez o termo “reactance”. Ou, em português: “reatância”.

O termo, contrabandeado da física para a psicologia, descreve um fenómeno muito comum nas brigas de casal. Do género: eu gosto de vermelho, mas se, no meio da discussão, a minha cara metade me diz que o vermelho é lindo, eu imediatamente declaro que é a cor mais abominável que existe. E até passo a acreditar nisso, com toda a sinceridade – só para contrariar.

Os psicólogos explicam que este é um mecanismo que usamos para defender a nossa liberdade e autonomia. Quando sentimos que alguém nos está a tentar forçar, mesmo que com os argumentos mais racionais, a pensar ou fazer o que quer que seja, não nos contentamos em resistir. Entrincheiramo-nos na resistência, lançando mão de qualquer argumento para não ceder. Ainda que, para isso, a honestidade intelectual, a coerência, a lógica ou o bom senso tenham que ir às favas.

Cônjuges em situação de implicância mútua ou crianças pequenas são especialmente adeptos da “reatância”, mas estão longe de ser os únicos. O seu cliente, por exemplo, também é.

 

A reatância no marketing e nas vendas

Don Corleone e Donald Trump - Uma oferta que não podes recusar

Todos já ouvimos dizer que “adoramos comprar – mas detestamos que nos vendam”. Porquê? Porque gostamos de pensar que as nossas decisões são tomadas de forma autónoma, sem influência de ninguém. É a reatância em ação.

Isto não significa, claro, que as velhíssimas formas de fazer pressão sobre o cliente – criando artificialmente urgência ou escassez, por exemplo – nunca vão funcionar. Às vezes funcionam, e é muito útil conhecê-las. Mas, em muitos casos, também podem criar a reação contrária à desejada. Já que me estão a tentar condicionar, não só não compro agora, como vou passar a fazer tudo para evitar as mensagens deste vendedor. Mando-as para o spam. Desligo mentalmente quando vejo a sua publicidade. Não atendo os seus telefonemas.

Foi por causa dessa percepção que a publicidade e as técnicas de venda descobriram o soft-selling, por oposição à venda agressiva e explicitamente manipuladora. “Uma oferta que não pode recusar”, no estilo Don Corleone ou, mais recentemente, Donald Trump, é precisamente a oferta que, se puder, vou querer recusar. Já uma abordagem que gentilmente me conduza a tirar as minhas próprias conclusões sobre o produto ou serviço apresentado tem uma probabilidade muito mais baixa de gerar reatância.

Uma oferta que se parece com uma chantagem pode causar o efeito contrário: reactance.

 

 

Como prevenir a reatância: 3 erros a evitar

1. Não trate o seu cliente como estúpido

“O consumidor não é estúpido – ele é a sua mulher” David Ogilvy

“O consumidor não é estúpido – ele é a sua mulher”, dizia David Ogilvy. O comentário pode ser um bocadinho machista, como era usual na altura dos Mad Men, mas a substância mantém-se. Ogilvy insurgia-se contra o seu concorrente (e cunhado) Rosser Reeves, que acreditava que nada era mais eficaz do que uma mensagem relevante martelada até à exaustão.

Em contraponto a essa ideia, alguns dos seus concorrentes descobriram que frequentemente uma publicidade que deixava espaço para a inteligência do consumidor aumentava a sua probabilidade de sucesso, por gerar menos resistência. Outro dos grandes da mesma altura, Howard Gossage, formulou a ideia de forma ainda mais interessante, embora, na mesma, politicamente incorreta:

“In baiting a trap, always leave room for the mouse”.

Noutras palavras: quando comunicar, dê espaço para que o seu cliente tire as suas próprias conclusões. Há muitas formas de fazer isso. Uma das óbvias: em vez de ser você próprio a dizer bem da sua empresa, use os testemunhos de terceiros. Na Hamlet sabemos, por experiência própria, que assim a reatância é muito menor.

 

2. Não abuse da manipulação

Começo por dizer que a palavra “manipulação” tem pior reputação do que merece. Manipulamo-nos uns aos outros o tempo todo: quando um pai um pai inventa uma história divertida para a filhota comer a  sopa ou perder ao medo aos monstros, por exemplo, não está a fazer outra coisa. Quanto às vendas, sem algum tipo de “manipulação” – ou seja, sem as muitas táticas psicológicas com que influenciamos a percepção dos outros – a maior parte delas simplesmente não aconteceria.

Ninguém explica isto melhor do que Robert Cialdini, que no livro Influence lista os 6 “gatilhos emocionais” que são tiro e queda para levar os outros a fazerem o que queremos.

Influence - The Psycology of Persuasion - Robert CialdiniUm livro obrigatório para entender como funciona a manipulação psicológica, nas vendas e não só

Usada com conta e medida, e, sobretudo, boa fé, algum tipo de manipulação psicológica é a base da persuasão – e a persuasão é a base das vendas e do marketing. O problema é quando se abusa. Ou quando deixamos o nosso objetivo tão à mostra que o tiro sai pela culatra: o cliente sente que está sendo empurrado para uma decisão e, como defesa, rejeita a compra.

 

3. Acene com o fruto proibido

Dito isto, e como comecei por lembrar, algumas táticas de persuasão claramente “manipulatórias” funcionam, e uma delas tem tudo a ver com a nossa propensão a fazer o contrário do que nos pedem. Os vendedores sempre a conheceram, assim como os autores de best-sellers e, hoje, os influenciadores digitais afeitos a teorias da conspiração.

Como o fruto proibido é sempre mais saboroso, prometer a receita “que as grandes farmacêuticas nunca quiseram que você conhecesse” tem uma boa probabilidade de despertar o desejo de muita gente.

Uma forma menos extrema de explorar a mesma tendência humana, e provavelmente mais aplicável ao universo B2B, é criar uma aura de exclusividade à volta de um produto ou serviço. Um evento ou comunidade empresarial, por exemplo, a que só se pode aceder por convite, ou mediante aceitação de uma candidatura, pode ser mais desejável exatamente porque é mais difícil participar.

 

4. Não mostre o jogo antes da hora

Não é por acaso que a fórmula mais famosa das técnicas de venda dá pelo nome de AIDA – e não DAAI, AADI ou outra combinação qualquer. A sequência importa:  se quero gerar uma ação, tenho de passar antes pela atenção, pelo interesse e pelo desejo. Passar ao “Call-to-Action” antes da hora é como convidar a moça ou o moço para o apartamento quando ainda nem trocaram dois dedos de conversa.

 

Ignorar o tempo de decisão do cliente, pressionando-o a decidir quando ainda não está no momento certo da sua jornada de compra, é a receita mais certa para criar reatância.

Muito melhor é adotar uma abordagem soft selling –  que pode pode passar pela venda consultiva, por uma estratégia de comunicação contínua através de conteúdos editoriais ou por uma publicidade que envolve e encanta antes de procurar vender.

Mesmo no momento da decisão, convém dar ao cliente a liberdade de voltar trás. Os testes gratuitos ou políticas de devolução sem perguntas são outras formas de gerar confiança – e evitar o reflexo de resistir.

 

Reatância – é mesmo necessário usar este termo?

Chegados aqui, será mesmo que queremos lançar mais uma buzzword no mercado, já tão sobrecarregado de jargão?

Pela minha parte, nem por por isso. A reatância é só mais um traço do comportamento humano que é preciso observar quando queremos influenciar atitudes e comportamentos. Uma manifestação particular, e às vezes divertida de ver, da resistência com que é sempre preciso contar nas vendas e no marketing.

Como empresa de comunicação de marketing B2B, na Hamlet procuramos todos os dias novas formas de vencer essa resistência. Para saber o que temos feito, e que resultados temos gerado para os nossos clientes, clique aqui.

 

Jayme Kopke

Categorias:
Business to business, Comunicação B2B, Comunicação de marca, Comunicação de marketing, content marketing, Estratégia, Influenciadores, Marketing B2B, pessoas, Testemunhos, Vendas
https://hamlet.com.pt/wp-content/uploads/2025/02/newsletterb_v1c2.svg
https://hamlet.com.pt/wp-content/uploads/2025/02/newsletterb_420_v1cb.svg
12
1
partilhe
Facebook
linkedin
Whatsapp
email
fechar
close
Newsletter B2B da Hamlet - A sua fonte de conhecimento e atualização contínua sobre marketing e comunicação business-to-business
Em conformidade com o Regulamento Geral da Proteção de Dados da União Europeia, informamos que ao clicar "Subscrever":
1) Aceita receber as nossas comunicações por email.
2) Autoriza que as informações que forneceu sejam transferidas para o nosso parceiro de marketing Mailchimp para processamento.
Saiba mais sobre as práticas de privacidade do Mailchimp.
close

Newsletter B2B da Hamlet

Precisa vender ou comunicar com empresas ou públicos profissionais? Bem-vindo à Newsletter B2B da Hamlet. A sua fonte de conhecimento e atualização contínua sobre marketing e comunicação business-to-business.
Em conformidade com o Regulamento Geral da Proteção de Dados da União Europeia, informamos que ao clicar "Subscrever":
1) Aceita receber as nossas comunicações por email.
2) Autoriza que as informações que forneceu sejam transferidas para o nosso parceiro de marketing Mailchimp para processamento.
Saiba mais sobre as práticas de privacidade do Mailchimp.